terça-feira, 22 de novembro de 2016

"As eleições americanas abalaram o mundo !"


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As eleições americanas abalaram o mundo. Fazem  quase duas semanas que terminaram e a poeira ainda não assentou.  Existem muitas dúvidas e incertezas sobre o que Donald Trump fará, uma vez empossado. Eu mesmo que escrevo sempre sobre  a situação do Brasil, me sinto agora impelido a escrever  sobre Trump e a sua vitoria na eleição para
presidente dos Estados Unidos, pois são muitas as pessoas que me pedem uma opinião. O que significa essa eleição?

Muitos analistas saíram correndo para tentar explicar a derrota de Hillary Clinton. Primeiro as abstenções. Depois a desinformação. Depois ainda, a internet. A globalização. A mídia. A Russia. Os emails particulares de Hillary. A ousadia de Trump. Mas nenhum deles sozinho, serve de explicação. 
Hillary ganhou no voto popular. Mas perdeu no Colégio Eleitoral. E nos Estados Unidos, o Colégio Eleitoral é que decide a eleição. No entanto, mesmo ganhando no voto popular, Hillary teve menos votos que Obama na eleição passada: 59,1 milhões de votos para Hillary agora, contra 59,7 milhão para Obama na eleição passada.
Já  Donald Trump recebeu dois milhões de votos mais que Mitt Romney, o candidato republicano da eleição anterior: 59,04 milhões de votos para Trump agora, contra 57 milhões para Mitt Romney na eleição passada. Portanto, mesmo perdendo no voto popular, os republicanos aumentaram sua votação. Já os democratas perderam votos. O que significa que o problema não foi apenas o discurso de Trump, mas também uma grande
rejeição a Hillary.

Quando de seu discurso logo após a vitória, Trump sinalizou que pode adotar um tom diferente no governo, do que aquele que norteou sua campanha. Ou seja, o sistema, independente do discurso do candidato eleito, começou a mostrar, desde o início do processo pós eleitoral, que vai tentar se impor sobre Trump.
O sistema, para se ter uma ideia aproximada, pode ser visto como um conjunto,  composto pelo Congresso, pelos Tribunais, as grandes empresas, os governantes estaduais, a mídia, as ONGs e até mesmo a pressão popular. Isso é o sistema.
Mesmo que Trump tenha feito uma campanha praticamente "solo", é preciso ver até onde o discurso vai se submeter ao sistema. Por que foi o discurso que ganhou a eleição contra Hillary, que era a candidata da maior parte do sistema.

Não creio que o discurso duro de Trump tenha sido suficiente para elegê-lo, se não houvesse uma  grande rejeição a Hillary. A questão racial por exemplo, foi importante. Mas a questão social também. Trump teve os votos dos trabalhadores brancos menos instruídos. Mas grande parte desse eleitorado é o mesmo que ajudou a eleger e reeleger Barack Obama, o primeiro presidente negro americano.
Na época, Obama perdeu entre os sulistas, com tradição escravocrata e boa influência da Ku-Klux-Klan, mas teve o apoio de grande parte desse mesmo eleitorado no norte.
Agora, nesta eleição, mesmo esse eleitorado do norte, que havia votado em um negro por duas vezes seguidas, votou esmagadoramente em Trump,embora tivesse como alternativa uma candidata tão branca quanto ele.
A mídia fez campanha contra Trump pelo seu discurso em relação às mulheres.
No entanto, 45% das mulheres americanas votaram nele. Entre as brancas, Trump teve 56% dos votos e 29% da preferência das mulheres latinas.

Mesmo tendo problemas com o seu partido, pois a grande maioria dos caciques republicanos o rejeitava, Trump soube romper a barreira que tentaram colocar em sua frente e avançou sobre um eleitorado descontente, expondo distorções de um sistema que tem sido incapaz de assegurar o "bem-estar" para toda a população.
Conseguiu o apoio do eleitorado branco mais velho e com menor grau de instrução. Teve apoio massivo nas zonas rurais e nos subúrbios industriais, parcelas afetadas pela globalização da produção e ressentidas por terem sido colocadas à margem do progresso, tal qual os ingleses que votaram pelo Brexit.
Desta forma Trump ganhou apoio em redutos que, em condições normais seriam favoráveis a Hillary. Pelo menos 11% dos democratas votaram em Trump. E ele ganhou em colégios eleitorais decisivos como a Flórida, Michigan e a Pensilvânia, apesar da maioria de negros e imigrantes nestes redutos eleitorais.

Mais de 59 milhões de americanos votaram em Trump, seja apoiando seu discurso, seja por que rejeitavam  o que era expressado por Hillary Clinton.
Trump apoiou sua campanha no nacionalismo, no isolacionismo, na xenofobia, no racismo.
Mas ele não teria sido eleito apenas por quem apoia esse discurso. Ele teve o apoio de quem estava buscando uma mudança radical na política americana, lutando por mais empregos e melhores condições de vida,coisa que Obama  não foi capaz de fazer. Grande parte da população votou não simplesmente no discurso de Trump, mas principalmente votou contra Obama e Hillary e pela retomada do "sonho americano".

Dificilmente o isolacionismo trará de volta o emprego dos americanos.
Grandes empresas  americanas produzem na China e no México, onde é mais barato produzir e exportam para outros países, inclusive para os Estados Unidos. Criar barreiras para a entrada destes produtos nos Estados Unidos vai colocar essas empresas contra Trump. Além disso, a falta desses produtos vai elevar seu preço nos Estados Unidos, diminuindo o consumo e provocando desemprego. Exatamente o inverso do que Trump o quis dizer com seu discurso.

O isolacionismo vai também afastá-lo da Europa e abrir caminho para lideranças ocasionais, lideranças incertas, contraditórias e nem sempre aliadas  dos Estados Unidos. Vai também abrir vácuos de poder pelo mundo, favorecendo interesses de potencias regionais. Vai favorecer a expansão da China na Asia, principalmente contra a Coreia do Sul e o Japão. Vai favorecer a expansão da Russia de Putin pela Europa Oriental. Vai alimentar a ambição de Erdogan da Turquia sobre territórios da Síria e do Iraque, assim como  as ambições dos iranianos no Oriente Médio xiita, deixando isolada a Arábia Saudita.

Se Trump tentar cumprir à risca seu discurso, vai contrariar todas as alianças americanas desde a segunda guerra mundial, começando por ignorar a Conferência de Bretton Woods em  julho de 1944, quando os americanos assentaram a nova ordem econômica ocidental. Vai também passar por cima do Acordo de Livre  Comércio da América do Norte (Nafta ) assinado  por Bill Clinton e da Parceria Transpacífica, assinada por Obama. Vai sair da Otan, criando um problema sério com a Europa Ocidental.
Tudo isto vai contrariar interesses americanos pelo mundo. Interesses não apenas comerciais, mas geopolíticos também.

Ao contrário de Hillary, a estrutura da campanha de Trump era caótica.
Abandonado pela maioria dos caciques republicanos, ele subia sozinho nos palanques, enquanto Hillary tinha com ela toda uma galáxia de estrelas democratas, além de uma  grande quantidade de artistas famosos. Mesmo assim Trump venceu.

Donald Trump vai assumir a presidência dos Estados Unidos aos 71 anos incompletos,  como talvez o mais inexperiente de todos os presidentes americanos até hoje. O verdadeiro "aprendiz de feiticeiro". Vai pousar direto no topo, sem ter passado antes por qualquer cargo público.
Vai dispor de pouco mais de 70 dias para montar uma equipe de governo, preencher  4 mil cargos federais e assumir 2,9 milhões de funcionários civis e 1,5 milhão de militares. Não é pouca coisa para um candidato cuja força maior foi ser visto por seus eleitores como um "super-man",que pode tudo sozinho e não deve nada a ninguem.
Mas esse isolacionismo que na campanha soou como força de Trump, vai mostrar sua fragilidade agora no governo. Foi possível fazer a campanha quase sozinho. Mas não será possivel governar sozinho,aconselhado apenas pela mulher e os filhos como na campanha.

Por ter sido eleito presidente, Trump vai começar a receber desde agora, os mesmos relatórios diários e ultra secretos que são recebidos também por Barack Obama. E estes relatórios, pela gama de problemas que apresentam e pela visão que trazem dos Estados Unidos e do mundo, podem ser o ponto de partida para o início de uma virada em sua visão
como presidente. Podem ser o inicio de sua transição intelectual do mundo, saindo do discurso de campanha para o mundo concreto do poder e do universo real da geopolítica. E ele vai ter que avaliar, se sustenta as linhas  mestras de seu discurso de campanha, apoiado na sua inexperiência, ou se cede  aos interesses do sistema.

Grande abraço,

Carlos Montarroyos

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