Se para a maioria dos moçambicanos a chegada do papa Francisco nesta quarta-feira será um estímulo para a fé e a precária paz do país, para alguns jovens sem lar e dependentes químicos ela significará ter um refúgio em Maputo, a capital do país.
Alguns poucos jovens que integram o projeto católico Casa Mateus 25 e que estão em situação de exclusão social, como portadores de deficiências e vítimas de abandono ou das drogas, terão a oportunidade de se reunir em particular nesta quinta-feira com o pontífice.
O líder religioso, que começa hoje em Moçambique uma excursão pelo continente africano, que inclui visitas a Madagascar e às Ilhas Mauricio até terça-feira de semana que vem, inaugurará as novas instalações do centro católico.
Paulo, de 17 anos e que já é um dos veteranos do projeto, será um dos sortudos que poderá conhecer Francisco em pessoa. O garoto espera que, com a visita do papa, muitos dos jovens do centro possam sair definitivamente das drogas.
Paulo vive nas ruas de Maputo há sete anos: "Saí de casa quando tinha dez anos, depois que apanhei de alguém que não era a minha mãe", contou à Efe.
Sua verdadeira mãe o deixou com seu pai quando tinha 3 anos, mas o garoto explicou que todo o mau chegou junto com quem chamou de "a nova mulher". "Fui maltratado, ia machucado para a escola, os vizinhos tiveram que me ajudar a comer e me deram um teto para dormir", recordou.
Finalmente, fugiu de casa e dos maus-tratos e passou a viver nas ruas. Tentou buscar refúgio em alguma igreja, sem muito sucesso, até que em 2018 encontrou calor humano e um prato de comida em um grupo que se reunia ao anoitecer no Parque dos Continuadores, a poucos metros do palácio presidencial.
Foi ali que começaram as reuniões de apoio a alcoólatras e dependentes químicos, que, pouco tempo depois, migraram para o lado de fora da Igreja Nossa Senhora das Vitórias. Há alguns meses, os encontros passaram a ser realizados em um novo espaço, cedido pelo governo e que será abençoado nesta quinta-feira pelo pontífice argentino.
Paulo seguiu os 12 passos que lhe passaram para chegar à sobriedade, se reuniu com os religiosos e acaba de se formar em um curso de decorações de eventos. "Agora voltei à escola para ser carpinteiro", disse.
"Prometi aos padres que em 2019 não estaria mais na rua, foi uma promessa que fiz com Deus. Que ele me ajudaria, porque em outubro de 2019 já não queria mais estar nas ruas", relatou o jovem, que conseguiu cumprir a promessa e hoje vive com uma família que o acolheu. Porém, a vida no centro de acolhimento não é nada fácil.
"Quem vive na rua acaba se submetendo a algumas regras", explicou o secretário da Nunciatura Apostólica em Moçambique, o monsenhor Cristiano Antonietti.
"Aqui temos pessoas com licenciatura, que tinham tudo, mas, devido a certas circunstâncias, vieram parar aqui e agora precisam de um apoio momentâneo para se reerguer", afirmou o religioso.
"A Casa Mateus 25 não será um lugar de acolhida permanente, mas sim um centro diurno que oferece um maior número de atividades aos participantes", completou.
Paulo não é a única história de sucesso do projeto. Segundo Antonietti, atualmente 25 pessoas já foram acolhidas por famílias e são acompanhadas periodicamente, além de receberem cestas básicas e um auxílio para o pagamento das taxas de matrículas escolares.
Nesta terça, antes da chegada do papa, a Casa Mateus 25 se dedicou com esmero aos últimos preparativos em meio a canções e danças, embora seus integrantes também prestem atenção à higiene pessoal e ao visual, começando com um bom corte de cabelo.
Paulo está relutante sobre passar pela barbearia - "me deixa com espinhas" -, mas tem que seguir as regras se quiser ter o privilégio de conhecer Jorge Mario Bergoglio pessoalmente.
Nesta quinta-feira, o adolescente poderá expor ao pontífice todas as suas ideias: "eu gostaria que todos os meus irmãos estivessem aqui, que pudessem deixar a rua, deixar as drogas, ter um novo lar para viver, para estudar e poder aprender uma profissão", afirmou.
Adérito Caldeira.
Fonte - Agencia EFE / Agencia Brasil
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